No íntimo da fé, as lágrimas transcendem a mera expressão de sofrimento, alçando-se a um patamar de significado especial perante o divino. Cada lágrima, mesmo nascida da rebeldia humana, não escapa ao olhar compassivo de Deus. A dor humana, em suas diversas facetas, encontra eco no coração do Criador. A figura messiânica, inclusive, é reconhecida como “Homem de Dores”, conhecedor de cada tipo de sofrimento.
Davi, figura messiânica e ancestral, experimentou inúmeras provações ao longo da vida, que o inspiraram a compor salmos carregados de emoção. No Salmo 56, ele narra a perseguição e os ataques de seus inimigos, suplicando que Deus registre suas peregrinações e guarde suas lágrimas em um odre.
A imagem do odre, um recipiente de couro utilizado para armazenar líquidos, assume o simbolismo de um depositário de lágrimas. Civilizações antigas praticavam o costume de coletar lágrimas em tempos de angústia, preservando-as em “lacrimatórios” como memória de tempos difíceis. A descoberta de lacrimatórios em túmulos romanos atesta essa prática. Se os homens valorizavam as lágrimas a ponto de preservá-las, quanto mais Deus, que tudo vê e conhece.
Além do conhecido Livro da Vida, mencionado nas orações de Selichot e nas Escrituras, que trata do destino dos homens, existe um livro celestial menos conhecido: o Livro das Lágrimas. Davi, em sua fé inabalável, questiona: “Não estão elas [as lágrimas] no teu livro?”. Ele compreendia que este livro registra o sofrimento da humanidade, desde Adão até as gerações futuras.
O Talmude Babilônico, interpretando Lamentações 3:8, relata que, após a destruição do Templo, as portas da oração tradicional foram fechadas. No entanto, as portas das lágrimas permanecem abertas, garantindo que o clamor a Deus será ouvido. O Salmo 39:12 reforça essa ideia: “Ouve, Senhor, a minha oração, e inclina os teus ouvidos ao meu clamor; não te cales perante as minhas lágrimas”. Independentemente da magnitude do sofrimento, as portas das lágrimas sempre oferecem acesso ao coração divino.
Inspirada no Salmo 6, a tradição rabínica ensina que as lágrimas abrem portais que a oração, por vezes, não alcança. “O Senhor ouviu a voz do meu choro” (v.8). As lágrimas possuem uma voz própria, audível a Deus. Uma lágrima silenciosa, vertida por um coração aflito, pode ser mais eloquente do que palavras e, certamente, será registrada no livro de Deus.
Davi, à semelhança do Messias, experimentou profundamente o sofrimento em suas diversas formas. Jesus, embora os Evangelhos registrem seu choro em poucas ocasiões, certamente derramou muitas lágrimas em súplica e intercessão. Assim como Davi, Yeshua conhecia o poder das lágrimas, sabendo que nenhuma seria esquecida, mas guardada e registrada no Livro das Lágrimas, como um memorial perante o Pai.
As lágrimas sinceras têm a capacidade única de tocar o coração de Deus, impulsionando a resposta a orações. Ao serem inscritas no Livro das Lágrimas, transformam-se em relatos eternos, acariciados por Deus.
Fonte: guiame.com.br